Em lançamento de chapa com Alckmin, Lula diz que vencerá ameaça autoritária

O ex-presidente defendeu o que chama de “soberania nacional” e falou pela primeira vez sobre tornar o país atrativo para investimentos

Por

Bloomberg Línea — Diante de algumas milhares de pessoas num centro de convenções em São Paulo, na manhã deste sábado (7), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou sua candidatura a presidente da República, pregando a união de democratas de diferentes matizes para “vencer a ameaça autoritária” e governar para devolver ao país o crescimento econômico com inclusão social.

Em seu discurso, pautado no que chamou de “soberania nacional”, durante pouco mais de 45 minutos e com poucos momentos de improviso, Lula disse que foi buscar em Geraldo Alckmin, ex-adversário, a aliança para um movimento, além da esquerda, para deter a ameaça à democracia que identifica no projeto do presidente Jair Bolsonaro. Os trechos mais duros do discurso de Lula foram justamente sobre a questão democrática.

“Queremos voltar para que ninguém nunca mais ouse desafiar a democracia. E para que o fascismo seja devolvido ao esgoto da história, de onde jamais deveria ter saído”, disse.

“O Brasil precisa voltar a ser um país normal, no mais alto sentido da palavra. Não somos a terra do faroeste, onde cada um impõe a sua própria lei. Temos a lei maior – a Constituição – que rege a nossa existência coletiva, e ninguém, absolutamente ninguém, está acima dela, ninguém tem o direito de ignorá-la ou de afrontá-la”.

“A normalidade democrática está consagrada na Constituição. É ela que estabelece os direitos e obrigações de cada poder, de cada instituição, de cada um de nós. É imperioso que cada um volte a tratar dos assuntos de sua competência. Sem exorbitar, sem extrapolar, sem interferir nas atribuições alheias”.

“Chega de ameaças, chega de suspeições absurdas, chega de chantagens verbais, chega de tensões artificiais. O país precisa de calma e tranquilidade para trabalhar e vencer as dificuldades atuais. E decidirá livremente, no momento que a lei determina, quem deve governá-lo”.

Economia

No campo econômico, Lula voltou a culpar Bolsonaro pela alta do preço dos combustíveis e do gás de cozinha e voltou a prometer “colocar a Petrobras novamente a serviço do povo brasileiro, não dos grandes acionistas internacionais”.

“Precisamos fazer novamente do pré-sal o nosso grande passaporte para o futuro, financiando a saúde a educação e a ciência”, disse.

Ele também repetiu as críticas ao processo de privatização da Eletrobrás, que está em curso, chamando a proposta de “crime de lesa-pátria”, o que resultaria na perda da soberania energética e inviabilizaria, segundo ele, programas como o Luz para Todos.

Lula falou também pela primeira vez na atual campanha sobre tornar o país atrativo para o investimento, com “garantia de retorno seguro e justo”.

“Precisamos colocar novamente o Brasil entre as maiores economias do mundo, reverter o acelerado processo de desindustrialização do país e criar um ambiente de estabilidade política, econômica e institucional que incentive os empresários a investirem outra vez no Brasil, com garantia de retorno seguro e justo, para eles e para o país”.

Lula disse também que a ex-presidente Dilma Rousseff, que estava presente no evento, “não cabe em um ministério”.

“Tem muita gente, na perspectiva de criar confusão entre nós dois, que diz: ‘você vai levar a Dilma para o ministério?’ .Nem eu vou levar, e jamais a Dilma caberia em um ministério. Porque a Dilma tem a grandeza de ter sido a primeira mulher presidente da história deste país”.

Em tom moderado que remeteu ao “Lulinha, Paz e Amor”, slogan de sua campanha de 2002, Lula encerrou seu discurso dizendo que voltará “efetivamente com o coração mais brando do que eu já tive em qualquer outro momento”, e que “vamos vencer a disputa distribuindo sorrisos, criando paz e harmonia”.

“Lula com chuchu”

O evento no Expo Center Norte neste sábado contrastou com o ato de Primeiro de Maio, em que Lula discursou para um número bem inferior de pessoas no Pacaembu, também em São Paulo. Agora, caravanas de militantes de vários estados, movimentos sociais, ativistas de partidos aliados e personalidades da internet e da TV lotaram o centro de convenções, um dos principais centros de eventos da capital paulista.

Aliados do PT em diversos estados vieram a São Paulo. Jingles das campanhas anteriores de Lula foram tocados – um deles, da campanha de 1989 (“Sem Medo de Ser Feliz”), simbologia da esquerda brasileira, ganhou uma nova versão com artistas como Zélia Duncan, Martinho da Vila, Chico César, Lenine, Duda Beat, Paulo Miklos, entre outros.

Num dado momento, nos primeiros minutos do evento, o público ovacionou quando foram exibidos flashes de vídeos do Jornal Nacional em que foram apresentadas notícias como o da anulação de suas condenações pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ou a decisão do Conselho de Direitos Humanos da ONU que considerou que ele não teve um julgamento justo. A cantora Tereza Cristina, apoiadora de Lula, abriu a cerimônia, cantando o Hino Nacional.

Companheiro da chapa de Lula, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSB) não foi presencialmente ao evento por ter contraído covid-19, mas discursou ao vivo por teleconferência durante quase 15 minutos.

“Quando o presidente Lula me estendeu a mão, eu vi nesse gesto muito mais do que um sinal de reconciliação entre dois adversários históricos. Vi um verdadeiro chamado à razão”, afirmou Alckmin.

O ex-governador criticou o atual presidente por “aviltar as eleições”. “As próximas eleições serão um grande teste para nossa democracia. Sem Lula não haverá alternância de poder e sem alternância de poder não haverá garantias para nossa democracia”.

Alckmin agradeceu publicamente o ex-presidente Lula pelo “privilégio de sua confiança” e, na sequência, arrancou risos da plateia ao dizer que “Lula é um prato que cai bem com Chuchu”. Quando governava SP no início da década de 2000, o então tucano ganhou o apelido de “picolé de chuchu” em alusão à sua falta de carisma.

Leia também

Chefe da CIA disse a integrantes do governo que Bolsonaro não deveria questionar eleições

Com inflação, supermercado vira principal gasto das classes C e D no Brasil