Cidadania italiana: veja o que muda no processo de reconhecimento

A partir de julho, mais tribunais da Itália vão ter permissão para julgar os pedidos

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São Paulo — A partir de julho deste ano, o processo judicial de reconhecimento de cidadania italiana sofrerá mudanças, após uma reforma no Código de Processo Civil, aprovada no Parlamento italiano. No Brasil, cerca de 30 milhões de pessoas podem ter o direito de conquistar a dupla cidadania, segundo Rafael Gianesini, CEO e cofundador da Cidadania4u, empresa especializada em cidadania italiana e portuguesa, citando genealogistas como fonte da informação.

Ele aponta como principal mudança o aumento do número de juízes e tribunais que vão passar a analisar os casos, o que pode agilizar a conclusão dos processos. Hoje a demora chega até dois anos de tramitação.

  • Os pedidos de cidadania pela via judicial não serão exclusivamente julgadas no Tribunal de Roma, e sim no Tribunal da região de nascimento do Dante Causa (o antepassado italiano)

“Nos últimos anos, o número de processos protocolados no Tribunal de Roma subiu muito. Por isso, notaram a necessidade de uma maior agilidade no processo possibilitando maior capilaridade dos serviços e redução de sobrecarga no sistema judiciário italiano”, observou Gianesini.

O especialista afirmou que, apesar dos benefícios à primeira vista, pode haver problemas em relação a uniformização dos entendimentos: diferentes tribunais podem decidir uma mesma questão de maneiras divergentes. Quando todos os processos ocorriam no Tribunal de Roma não havia este problema, ressalva.

Segundo o especialista, outro ponto que pode gerar impasses no processo é a Grande Naturalização (GN, o decreto brasileiro que naturalizou todos os estrangeiros que estavam em solo brasileiro entre 1889 e 1891). “Os juízes do Tribunal de Roma, em primeira instância, não acataram a tese da GN em 2021, mas não se sabe qual será o entendimento dos demais tribunais italianos sobre o assunto, o que pode dificultar o processo de cidadania de muitos brasileiros”, alerta Gianesini.

Atualmente é possível obter a dupla cidadania de três formas: 1) pela Comune (processos por residência) na Itália, onde o processo é administrativo; 2) administrativamente por meio do Consulado italiano no Brasil; ou 3) pela via da Justiça local, quando individual ou coletivamente é movida uma ação judicial junto ao tribunal em Roma na Itália.

Empreender nos EUA

A demanda por processos de reconhecimento de cidadania italiana está em alta no Brasil, segundo Gianesini. A Cidadania4u recebe cerca de 300 clientes por mês, em média. Alguns brasileiros buscam a cidadania italiana para facilitar a entrada nos EUA.

Segundo Renato Lopes, CEO da agência Lopes & Avv. Domenico Morra, ser um cidadão italiano faz com que o brasileiro tenha a oportunidade de investir menos para o Green Card, documento que dá a permissão como imigrante legal de residência, trabalho, estudo e demais direitos e deveres nos EUA. “Com a cidadania, o imigrante do Brasil pode entrar nos EUA com investimentos em novos negócios a partir de US$ 100 mil, com o visto E-2″, diz.

Caso não tenha a cidadania italiana, o brasileiro terá de investir uma quantia bem maior nos EUA. “Para se ter uma ideia do tamanho desse benefício, imigrantes brasileiros que não possuem a cidadania italiana só podem entrar nos EUA e pleitear o Green Card com o visto EB-5, porém o investimento inicial de novos negócios para esse tipo de operação deve ser de US$ 900 mil, de acordo com as regras imigratórias do governo americano”, detalha Lopes.

Muito além do que imigrar para os EUA para ter um negócio em solo americano, o passaporte italiano proporciona outros benefícios, principalmente às famílias com filhos ou a quem deseja estudar em uma faculdade, segundo Lopes. “O imigrante do Brasil reconhecido cidadão italiano será imigrante legal nos EUA e terá os mesmos direitos dos americanos. A extensão dos direitos aos filhos, também detentores da cidadania, permite frequentar as escolas públicas do país”, afirma o CEO.

Parentesco

Para iniciar o processo via ação judicial, o requerente deve juntar o máximo de documentos possíveis (certidões de nascimento, casamento etc.) do antenato (ascendente) italiano/a da família. “É importante frisar que o governo da Itália não exige um grau mínimo de parentesco entre o requerente brasileiro e o antenato”, explica Lopes

Desta forma, brasileiros que possuem avós, bisavós, tataravós ou outros parentes consanguíneos na “árvore genealógica” reconhecidamente nascidos na Itália estão aptos a serem considerados cidadãos do país. Porém, há alguns casos em que a cidadania não é permitida. “Se o parente vindo da Itália para o Brasil tiver obtido naturalização brasileira antes do nascimento do primeiro filho, automaticamente os requerentes não poderão ser reconhecidos como italianos”, ressalva o CEO da agência Lopes & Avv. Domenico Morra.

De acordo com o especialista, a via judicial, atualmente, é a que apresenta mais garantias contra fraudes. Porém faz um alerta: “como qualquer ação judicial, o processo estará baseado nos documentos apresentados pelo requerente para a análise do juiz competente, que poderá deferir ou indeferir o pedido”, ressalta o CEO.

Documentação

Se toda a documentação estiver correta e o grau de parentesco for legitimado, o juiz decide de forma favorável ao requerente. “Quando a ação judicial no tribunal da Itália for considerada transitada em julgado, ou seja, com decisão final, o brasileiro terá homologação oficial expedida por um juízo, o que torna o processo irrevogável, conferindo maior segurança do que outros meios”, esclarece Lopes.

Depois da juntada das certidões – tanto do ascendente italiano quanto dos requerentes –, a documentação é enviada para a Itália, onde será ingressada a ação judicial no tribunal de Roma, aguardando a apreciação do juiz. De acordo com Lopes, não existe tempo para a ação ser julgada. “Hoje, em média, os processos enviados do Brasil e abertos na Itália têm levado de 12 a 18 meses para a sentença transitada em julgado (decisão final)”, afirma.

Após o trânsito em julgado, será necessário esperar de três a quatro meses para que a Comune transcreva a decisão, homologando o requerente como cidadão italiano. “Pode-se afirmar que o processo todo, da ação judicial ao documento em mãos que permite tirar o passaporte italiano nos consulados italianos locais, levará em média de 21 a 24 meses, atualmente”, estima o especialista.

Mesmo por conta da pandemia de Covid-19, os processos de dupla cidadania na Itália estão sendo julgados normalmente, segundo Lopes. O tribunal em Roma, desde o final de 2020, adota o sistema virtual de julgamentos, o que tem permitido manter as decisões dos juízes para pedidos de reconhecimento da dupla cidadania.

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